‘Todo mundo’ não é jornalista

Reprodução da Internet | Google

Em 1897, o New York Sun lançou o editorial que virou um clássico – “Não, Virginia, Papai Noel não existe” – em resposta à menina de oito anos que escreveu uma carta ao jornal duvidando da existência do velhinho. Hoje meninas de oito anos publicam blogs, criam sites, e têm a certeza de que são jornalistas. Gravam-se uma resposta na rua, transcrevem, titulam e, ao contrário da dúvida de Virginia, acreditam que são jornalistas. Elas e o resto.

Basta entrar na internet, aprender algumas regras, engolir manuais de jornalismo e administração, munir-se de uma empáfia incomum e sair publicando, contaminando corações e mentes. No extremo, chega-se a Louis Bloom (Jake Gyllenhaal) no filme O Abutre.

Em O Abutre (Nightcrawler, 2014), do americano Dan Gilroy, o ex-ladrão de ferragens se deu bem com a editora louraça de TV de Los Angeles, Nina ( Rene Russo), onde pretendia trabalhar. Era um sociopata, mas cumpria as exigências do jornalismo da rede: trazer imagens chocantes e sensacionalistas de acidentes.

No mundo do cada um por si da internet, Louis Bloom descobre que cinegrafistas freelancers se ligam na frequência de rádios da polícia e correm para filmar o sangue fresquinho no local do acidente. Simples arrumar uma filmadora furreca e correr atrás.

Com métodos escusos para passar à frente da concorrência, suas imagens chegam primeiro, vendem, o público aumenta, e agora é alimentar a sede de horrores da emissora e, supostamente, do público. Louis Bloom ganha cada vez mais para dar um upgrade no equipamento profissional, colher mais sangue e descobrir que a ética só atrapalha.

Provoca um acidente do colega que está no seu caminho, arma uma emboscada para o subordinado que quer ganhar mais, filma o acidente do primeiro e a morte do segundo, começa a interferir na cena dos crimes para torná-los mais… jornalísticos.

Torna-se um “empreendedor” sem ética porque assimilou na internet um manual de autoajuda ao empresário – comum nos dias atuais. É ao mesmo tempo patrão e empregado, como se exige do jornalista hoje em dia, sem limites para vencer desde que publiquem seu material.

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Por Norma Couri, jornalista

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